Essa madrugada eu levantei e bati o dedinho do pé na quina do sofá. Mais uma vez.
Os nervos foram os primeiros a notarem o impacto. Avaliaram os danos e, nervosos, prontamente fizeram uma carta endereçada ao meu cérebro.
A mensagem subiu pela perna, por dentro do túnel na minha bacia até minha coluna. De lá, subiu de elevador até a base do crânio e foi entregue ao meu cérebro, que abriu e leu:
“Ai!
Ass: dedinho do pé direito”
Foi motivo de desespero. Apertou o botão vermelho — alerta, alerta! Instruções para gritar, para a perna se retrair evitando mais impacto. A consciência veio correndo:
– Nossa! O que aconteceu?
– Leia essa carta! — disse o cérebro, esbaforido.
Mas antes que conseguisse ler, foi interrompida pela dor. A dor é uma megera desgraçada que observa tudo. Maldita, não deixa escapar nada…
Em meio às pauladas, ela gritou com sua voz ardida no ouvido da consciência:
– Você bateu o dedinho do pé, seu vagabundo! Seu merda!
– Tá bom — Ai! — você pode — Ai! — para de me bater? — clamou, em vão.
Atordoada, minha consciência resolveu pegar o megafone e falar pela boca, para todos ouvirem:
– PU-TA-QUE-O-PA-RIU! — gritou.
O corpo inteiro ouviu. E tremeu.
A polícia mandou os anticorpos avaliarem o local do acidente. Os advogados iniciaram processos inflamatórios. As mãos foram de ambulância acolher o dedo ferido. Todo mundo trabalhou direitinho para não ouvir outra bronca.
No final, tudo ficou bem, não houve fratura ou escoriações. Só que a confusão toda me fez perder o sono.
Tudo culpa da bexiga…
O que achou?